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Transexualidade – identidade e cuidados desde a psicologia

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As culturas humanas criaram duas categorias de pessoas, dividindo-nos em dois gêneros: o homem e a mulher, baseados nos genitais com os quais nascemos. Além desta identidade de gênero precisamos de formas de expressão destas duas identidades que são os papéis de gênero (masculino e o feminino).

Algumas pessoas nascem com um sexo definido (macho ou fêmea), mas desenvolvem uma identidade oposta ao genital com a qual nasceu. Estas pessoas passam a infância e adolescência em conflitos emocionais importantes, pois o mundo as trata de modo oposto àquele com o qual se compreendem. Tratados como homens, sempre pensam dentro de si e se percebem mulheres. Tentam se expressar assim, mas isto apenas aumenta o conflito com o mundo externo, com o social. A maior parte das vezes somente adultos é que conseguirão tomar providências para superar estes dilemas emocionais. 

Estas pessoas são as transexuais ou transgênero. 

A partir da década de 1980 a condição transexual passa a ter um reconhecimento diagnóstico para oficialmente e permitir um tratamento que conduzisse à adequação corpo-mente.

No Brasil devem existir cerca de 50 mil transexuais à espera de receberem alguma atenção de saúde.

A cada cinco transexuais que nasceram com o sexo masculino, existe um que nasce com o sexo feminino.

Outra forma de se referir a esta condição é a Disforia de Gênero, e outras modalidades que demonstram uma condição patológica também tem sido tentadas, a exemplo de “neurodiscordância de gênero”. A questão é que poderia esta condição ser apenas uma variação psicossocial da expressão de ser humano e que não é uma patologia em si. 

O sofrimento transexual

A fase conflitante desde o nascer até tomar alguma providência que se coadune com o bem-estar é bastante complicada. A história de sofrimento constantes, intenso e facilitador de outros aspectos psicopatológicos é comum nestas pessoas. Estes sofrimentos são solitários e raramente expostos a outras pessoas. 

Estas pessoas envolvem-se em situações de risco de vida, tentativas de automutilação e o suicídio ocorrem com frequência.

Na falta da compreensão do que lhes ocorre, as pessoas à volta também não compreendem os sofrimentos destes transexuais. Passam a ser percebidos como pessoas estranhas e com “problemas”.

As famílias nas quais se integram não compreendem o que lhes passa, mas tentam impor-se no que consideram ser adequado, forçando que se enquadrem nos papéis sociais que a família supõe seja “normal”. Esta tentativa da família, tentando fazer o que consideram que é o melhor, apenas piorará ao longo de décadas toda a problemática emocional do transexual.

Na primeira década do século XXI, com a internet, estas pessoas puderam encontrar outras com as quais se identificaram em suas dores. Assim formaram comunidades pelo Orkut e trocam informações, orientações e tentam ajudar-se quando o mundo social não lhe aponta como solucionar seus lamentos e dores. 

O tratamento psicológico 

Embora muitos transexuais busquem o psicólogo para produzirem um “laudo”, a atuação psicoterápica tem várias funções reais que precisam ser consideradas. A busca do laudo implica na fantasia de que com as transformações cirúrgicas todo o tormento que viveram por décadas sumirá como por milagre.

trans identidadeQuando pensamos nesta pessoa que nos procura com todas as experiências de vida da condição de Disforia de Gênero, percebemos uma história de sofrimentos intensos, sejam estes na esfera pessoal ou social, portanto a primeira necessidade que surge é a necessidade de uma atuação emergencial.

A psicoterapia inicia-se na produção de um caminho de desenvolver capacidades de suportar frustrações e capacidades que não foram desenvolvidas ao logo da vida de sofrimento. Neste momento buscam-se as capacidades emocionais para enfrentar as frustrações que ainda virão e que todos os outros já desenvolveram desde a infância, mas que não tiveram outras problemáticas para administrar.

Outro aspecto importante para estas pessoas é a necessidade de desenvolver habilidades sociais, e novas formas de entrosamento interpessoal. Aprender a compreender novas emoções e como expressá-las de modo coerente com a nova identidade social de gênero é um caminho não trilhado cheio de emoções novas e boas que ainda não foram vivenciadas.

A capacidade de trabalho e atitudes profissionais laborais está na linha de ação psicológica. Pelos sofrimentos e o tempo gasto com estas emoções negativas, é mais comum que esta pessoa chegue aos 20 anos de idade sem experiências de trabalho, sem convívio com o mercado de trabalho. Esta falta de experiência somente aumenta a incapacidade real e a sentida a cada ano que se passa, piorando as capacidades desta pessoa, e tornando-a mais inútil ao mercado de trabalho e para os possíveis empregadores. Mais provavelmente esta pessoa parou de estudar no final do ensino fundamental com o objetivo individual de evitar o sofrimento de enfrentar um mundo que lhe denomina de modo contrário ao que se compreende em termos de ser homem ou mulher. Serão alguns anos desenvolvendo qualidades úteis para inserir-se no mercado de trabalho, ao mesmo tempo que precisará recuperar escolaridade perdida.

Outro aspecto importante e necessário será o desenvolvimento da capacidade de relacionamento interpessoal afetivo. Existem dois caminhos que podemos perceber são seguidos pelas pessoas transexuais. Muitas enveredam na prostituição como forma de se sustentar, o que conduz a relacionamentos muito variáveis e que não permitem desenvolvimento afetivo. O outro caminho também não auxilia muito pois produz relacionamentos incoerentes com a identidade de gênero que esta pessoa tem. Neste segundo caminho temos os que se casam de acordo com as regras sociais, implicando que se submetem a vivências inúteis e em desacordo com os projetos de futuro que precisam desenvolver para assumirem a nova identidade de gênero buscada. A outra vertente estabelece relacionamentos de comportamentos evasivos e evitativos da condição genital mesmo que muitas vezes sejam alvo de desejos por parte de outras pessoas exatamente pela existência de um genital que precisa ser futuramente modificado. Estas circunstâncias apenas produzem um histórico de vida que precisa ser remodelado.

A vivência social de adequação de gênero compõe este tratamento. Aprender a viver como uma pessoa de outro sexo, sem exageros, sem estereotipias, e modo a serem percebidas com naturalidade não é algo que acontece em poucas semanas. O aprendizado que todos vivem ao longo das duas primeiras décadas de vida precisa ser desenvolvido agora, de forma mais intensificada, e dirigida. A psicoterapia permite o acompanhamento para que os padrões sejam individualizados e possam ter uma expressão e uma marca individual da mesma forma que as outras pessoas.

homem-gravido-thomas-betie-400x250Outro passo necessário do acompanhamento psicoterápico é o preparo para a fase de modificações corporais. Para a maioria das pessoas, uma intervenção cirúrgica é uma forma de solucionar uma doença. Para outras pessoas é a busca fantasiosa de se mostrar melhor do que se é. Aos transexuais as transformações cirúrgicas misturam estas motivações e é necessário que existam equilíbrios emocionais para o enfrentamento. Muitos anos foram consumidos com auto promessas fantasiosas de um pós cirúrgico de sonhos. O reconhecimento de realidade e de possibilidades precisa ser muito bem elaborado, e mesmo assim frustrações acontecerão! Ansiedades não podem ser motivadoras para estes processos cirúrgicos. Se isto ocorrer teremos relatos de transexuais que se sentem injustiçados por cirurgiões que não cumpriram o que aqueles pacientes desejavam. Obviamente passar vários anos na sequência brigando com o cirurgião não fará este paciente feliz, nem solucionará as circunstâncias físicas que eram objetivo das cirurgias. Quando os cirurgiões acatam a necessidade cirúrgica destas pessoas, sem que tenham sido cuidadas nos aspectos psicossociais, ouvirão (e ultimamente lerão pela internet) as reclamações, mesmo que juridicamente nunca tenham como ser reparadas. A dificuldade de suportar frustrações e aproveitar os ganhos que desenvolveram apenas produzirá pessoas que continuam em busca de novas cirurgias estéticas de modo psicopatológico, e com novos sofrimentos. Estes aspectos têm sido percebidos por muitas pessoas como demonstração de terem estas pessoas sido um equívoco para estes tratamentos, e que outras não deveria ser submetidas a tratamentos cirúrgicos.

O suporte psicológico pós-cirúrgico permitirá adequar-se ao novo corpo, superar as frustrações decorrentes das expectativas reais e fantasiosas anteriores à cirurgia e desenvolver nova auto percepção corporal. Ainda resta um aspecto a ser desenvolvido: o comportamento sexual.

Existem muitos psicólogos e que atuam em muitas vertentes, sob muitas óticas diferentes. Porém poucos psicólogos atuam com transexuais, e poucos sabem como administrar as questões sexuais que advém diretamente desta proposta de trabalho. Os psicólogos que trabalham desde a teoria cognitivo-comportamental e que tem se dedicado à sexualidade/sexologia são os mais indicados para este tratamento.

 

 

 

Fonte:.revistaimpulso

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